Se homenagem a Pinochet é vetada, por que a Fidel é permitida?
No mês passado, como foi amplamente noticiado, o deputado estadual Frederico D’Ávila (PSL) tentou fazer uma homenagem ao general chileno Augusto Pinochet na Assembleia Legislativa de São Paulo e não conseguiu. Foi atacado de todos os lados, inclusive pela direita, e a sessão solene que propôs foi proibida pela Casa.
Justíssimo, afinal o regime do ditador Pinochet matou cerca de 3.000 pessoas e torturou e perseguiu dezenas de milhares em seus 17 anos de poder (1973-90). Homenagear essa figura é uma ideia descabida, para dizer o mínimo.
Em agosto de 2016, uma sessão solene na Câmara Municipal de São Paulo homenageou os 90 anos do ditador cubano Fidel Castro, que morreria em novembro daquele ano. Foi proposta pelo PC do B, e ninguém deu um pio.
A discrepância no tratamento é no mínimo intrigante.
Fidel à esquerda e Pinochet à direita representam o arquétipo do ditador latino-americano do século 20. Ambos mataram e prenderam opositores, censuraram a imprensa e atacaram as instituições que poderiam oferecer contrapesos a seus poderes absolutos.
(Em 2007, a mesma Assembleia que vetou Pinochet honrou o guerrilheiro Che Guevara, parceiro de Fidel na Revolução Cubana, aliás).
Há algumas nuances, claro. Fidel é festejado pela esquerda de forma praticamente unânime, enquanto Pinochet é criticado inclusive por boa parte da direita.
A forma como os dois chegaram ao poder também difere. O cubano verdadeiramente liderou uma revolução popular, que derrubou um ditador. Já o chileno deu um golpe sangrento contra um presidente eleito democraticamente.
Por outro lado, Pinochet convocou um plebiscito que levou à sua saída. Claro, fez isso não por ser um democrata, mas por intensa pressão interna e externa. Mas convocou, perdeu e aceitou o resultado. Fidel e seus sucessores não passaram nem perto disso.
Ah, mas os índices sociais cubanos, em saúde e educação, são positivos…
Verdade, mas relativizar a ditadura cubana com base nesses dados não é muito diferente do que minimizar os abusos de Pinochet em razão de suas reformas liberais, que pavimentaram o crescimento econômico chileno das últimas décadas.
O fato inegável é que ambos foram tiranos que não deveriam estar sendo homenageados.
E por que gritaria de um lado e silêncio de outro? Difícil dizer. Talvez porque a figura romântica de Fidel, de charuto na mão, tenha passado à história como sendo mais simpática do que o sinistro visual de Pinochet de óculos escuros e cara de genocida.
Ou, talvez, porque o inegável esquerdismo de grande parte de nossa academia e da imprensa tenha sido mais eficiente na construção da imagem de seu ditador de estimação. Nesse caso, talvez devêssemos saudar a incompetência da direita em nivelar o jogo.