Universidade não é nada sem liberdade, diz professor conservador que sofreu ataques

A ofensiva do governo federal contra dois docentes da UFPel (Universidade Federal de Pelotas) que criticaram o presidente Jair Bolsonaro despertou lembranças desagradáveis no professor Rodrigo Jungmann, da área de filosofia da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).

Conservador, Jungmann já foi alvo de militantes esquerdistas do campus diversas vezes. Teve sua sala arrombada e enfrentou protestos ao tentar exibir um documentário sobre o filósofo Olavo de Carvalho. Cartazes contrários a ele foram espalhados pela universidade.

Embora ideologicamente esteja distante dos alvos do governo na instituição gaúcha, que têm posições bem mais progressistas, ele considera inaceitável a perseguição sofrida pelos colegas.

“Acho absolutamente escandaloso, extremamente preocupante, porque deixa entrever a possibilidade bem real de que o governo Bolsonaro queira realmente a implantação de um Estado policial. Isso evidentemente é incompatível com a democracia, que vale para direita e para a esquerda”, afirma.

A ação ocorreu contra os professores Pedro Hallal e Eraldo dos Santos Pinheiro. Hallal, ex-reitor da universidade, é também coordenador da pesquisa nacional EpiCovid, principal estudo epidemiológico sobre a Covid-19, e um crítico da atuação do governo Bolsonaro na pandemia.

As falas dos docentes ocorreram em transmissão pela internet para posse da nova reitoria da universidade, em que Bolsonaro desprezou o candidato mais votado (embora tenha prerrogativa legal para isso). Hallal chamou o presidente de “desprezível”.

A pedido do deputado federal Bibo Nunes (PSL-RS), apoiador de Bolsonaro, a CGU (Controladoria Geral da União) abriu investigação contra os professores.

Também houve recomendação ao Ministério da Educação, feita pelo procurador do Ministério Público Federal Ailton Benedito para que investigue atos políticos-partidários em universidade. Benedito é um defensor do governo e uma influente voz conservadora no MPF.

O ministério a princípio acatou a sugestão do procurador, mas depois, frente à repercussão negativa, recuou e suspendeu ofício que barrava atos políticos em universidades. 

Para Jungmann, isso não muda o fato de que há uma ameaça grave de cerceamento contra manifestações de professores. “A universidade não é nada sem liberdade de expressão”, diz.

Ele considera esse caso até mais grave do que o seu, mesmo tendo sofrido ameaça de agressão física, coisa que não aconteceu contra os docentes de Pelotas.

“Eu efetivamente corri risco físico, mas o caso dos professores do Sul é mais grave, porque parte do próprio governo. Eu não posso dizer que tenha sido perseguido pelos governos Dilma ou Temer. Aqui é caso de ação governamental”, afirma.

“A Constituição estabelece como pilar a liberdade de expressão. O governo não pode usar como desculpa o fato de que desconhece isso”, acrescenta.

É urgente, afirma ele, que forças políticas moderadas dos dois lados contenham seus próprios extremistas. Só assim será possível formar uma espécie de “cordão sanitário” isolando os radicais, como acontece na Europa.

“Não adianta criticar os extremistas do outro lado. Isso não surte efeito. Mais importante é criticar os dos próprio lado. Isso que é necessário para pacificar a questão”.

Defender os colegas de Pelotas, afirma Jungmann, é questão de princípio, mesmo que os professores atacados tenham posições bem mais à esquerda.

“Minha solidariedade aos professores de Pelotas é irrestrita. A convergência ideológica aqui é irrelevante”, afirma.