Na direita, processo de martirização de Daniel Silveira já começou
Se, como tudo indica, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) gravou um vídeo com ofensas ao Supremo Tribunal Federal para se cacifar junto ao eleitorado de direita, os primeiros sinais são de que a estratégia funcionou.
Nos últimos três dias, acompanhei discussões em diversos grupos de WhatsApp conservadores, e a martirização de Silveira, preso por ordem do ministro Alexandre de Moraes, segue a todo o vapor.
Manifestações em defesa do parlamentar e até caravanas de apoios estão sendo marcadas. No domingo (21), haverá uma no Rio de Janeiro em frente ao Copacabana Palace “contra a ditadura do STF”. As hashtags #SomosTodosDanielSilveira e #EstamosComDanielSilveira estão sendo usadas.
Ativistas de São Paulo se organizam para participar do ato “contra as atitudes arbitrárias do [ministro] Alexandre de Moraes, que não merece respeito nem de uma ameba, em prol do deputado Daniel Silveira”.
Haverá vans para 20 pessoas, saindo no sábado e voltando logo após a manifestação, com hospedagem em residências de ativistas conservadores. Preço do Silveira Tour: R$ 100.
A imagem do grupo que organiza a viagem é uma foto de Silveira com a legenda: “O único parlamentar que peitou o STF. Cadê os outros parlamentares?”.
Prestes a ser expulso do PSL, o deputado já tem promessa de nova casa, o PTB, comandado pelo ex-deputado federal Roberto Jefferson, que o defendeu com sua retórica peculiar.
“Daniel Silveira sairá da cova dos leões. Daniel não será destroçado por garras criminosas. Não haverá restos e carcaças de seu corpo, não haverá despojos para os urubus prepotentes e tirânicos”, escreveu. Alguns ativistas já sonham lançá-lo candidato ao Senado ou mesmo ao governo do Rio no ano que vem.
Para isso, claro, Silveira terá de manter seus direitos políticos, o que é algo bastante duvidoso, neste momento. O deputado deve ter seu caso encaminhado ao Conselho de Ética da Câmara, e a possibilidade de cassação é real. Outro cenário é ele ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal por crimes previstos na Lei de Segurança Nacional.
Em qualquer uma desses hipóteses, o parlamentar ficaria inelegível e não poderia disputar a eleição de 2022. Por outro lado, é bem possível que, passada a fervura do momento, os ânimos arrefeçam e Silveira escape da cassação, recebendo uma pena menor, como a suspensão do mandato por um período.
É nisso que apostam ativistas em campanha me favor de Silveira. Desde a prisão, a mobilização ocorre de diversas formas.
Espécie de Porta dos Fundos de direita, o Canal Hipócritas gravou esquete parodiando as eliminações do Big Brother Brasil, em que disputam um paredão Silveira, a deputada Flordelis (PSD-RJ), acusada de participação no assassinato do marido, e o senador Chico Rodrigues (DEM-RR), pego com R$ 33 mil na cueca.
“Ele [Daniel Silveira] está no paredão pelo delito gravíssimo, o atentado perigosíssimo à democracia, o crime hediondo de falar o que pensa sobre o STF”, diz o ator que imita o apresentador Tiago Leifert.
“Talvez, em vez de xingar o STF, o Daniel Silveira deveria ter mandado assassinar pagando R$ 33 mil. É isso mesmo, STF?”, segue o esquete. Em dois dias, o vídeo teve 255 mil visualizações.
Tamanho grau de apoio mostra que a crise gerada pela prisão do deputado é uma batata quente para o presidente Jair Bolsonaro. Preocupado em não melindrar o STF, Bolsonaro até aqui lavou as mãos, e deixou o parlamentar ser queimado pelo Congresso e pelo Judiciário.
Esse distanciamento, no entanto, pode ter consequências políticas, e sinais de descontentamento da base conservadora já têm aparecido.
É difícil que um episódio pontual como esse afete de maneira duradoura a lealdade da direita ao presidente, ainda mais porque em breve o país estará novamente em campanha eleitoral. Em 2022, a maior parte do bloco conservador deve se unir em favor da reeleição de Bolsonaro.
A prisão de Daniel Silveira, no entanto, deve transformá-lo em um herói para a direita, ainda que momentâneo. Nada mal para um parlamentar inexpressivo, mais conhecido pela cara de mau do que pelas ideias.