Direita bolsonarista busca piada para minimizar nadegagate
Fazer piada. Mudar de assunto. Elogiar a isenção de Jair Bolsonaro.
Este é o resumo da reação da base conservadora do presidente à bombástica notícia da prisão de um de seus vice-líderes no Senado, Chico Rodrigues (DEM-RR), após ele ser pego escondendo dinheiro nas nádegas.
O contraste com a forma como a esquerda encarou notícia similar há 15 anos não poderia ser maior. Em julho de 2005, José Adalberto Vieira da Silva, assessor do então deputado estadual petista José Nobre Guimarães (CE), foi preso no aeroporto de Congonhas com R$ 437 mil escondidos na cueca.
A notícia causou alvoroço no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, à época combalido pelo escândalo do mensalão. Numa reunião de emergência no Palácio da Alvorada, o presidente chamou a notícia de “pesadelo”.
Guimarães é irmão do então presidente nacional do partido, José Genoino, que acabou saindo do cargo em razão do escândalo. Hoje deputado federal, Guimarães conseguiu se reabilitar internamente e coordena o grupo de trabalho no PT responsável pela estratégia eleitoral do partido. Já Genoino caiu no ostracismo político.
Na direita bolsonarista, a primeira reação foi entrar no coro do deboche. Espécie de líder extraoficial da tropa de choque digital do presidente, Allan dos Santos mal conseguia falar entre gargalhadas em um programa em seu canal no YouTube, poucas horas após o caso vir à tona.
“É a nova definição de centrão!”, bradou, para risos generalizados de seus debatedores. “Esse é um jornal sério! Só os assuntos que não são sérios”, contemporizou.
Ex-ministro da Educação, atualmente no Banco Mundial, Abraham Weintraub tuitou uma foto do Rabobank, um venerável banco holandês fundado no século 19 que jamais poderia imaginar que se prestaria a trocadilhos.
Reno Martins, ligado ao Instituto Conservador, fez piada com a promessa de Bolsonaro de “dar uma voadora” em acusados por corrupção em seu governo.
O próprio filósofo Olavo de Carvalho entrou na discussão, mas, estranhamente, foi mais comedido do que se poderia imaginar, dada sua predileção por temas escatológicos. Disse apenas que “se o dinheiro escondido no cu foi ganho honestamente, pior ainda”.
Já o perfil Lets Dex, de um bolsonarista anônimo, mas bastante influente na direita, tentou fazer uma comparação com o escândalo petista.
“Petista escondia dólar na cueca, vice líder do Bolsonaro esconde na bunda!! Quem é homofóbico agora? Hein?”, escreveu.
A segunda perna da estratégia é relegar o assunto a lugar secundário no noticiário. Por sorte, o ‘nadegagate’ coincidiu com um tema igualmente polêmico a mobilizar os conservadores: a censura cometida por redes sociais nos EUA quanto a uma reportagem do jornal americano New York Post contrária ao candidato democrata à Casa Branca, Joe Biden.
Por fim, influentes parlamentares da base de Bolsonaro, como as deputadas Bia Kicis (PSL-DF) e Carla Zambelli (PSL-SP), pediram imediatamente a saída de Rodrigues do cargo de vice-líder, e louvaram o presidente por sua decisão de afastá-lo. Isso seria mais uma prova do comprometimento do presidente com o combate à corrupção sem poupar aliados.
A preocupação dos bolsonaristas é tentar minimizar o incidente como algo folclórico, aproveitando o ridículo da situação. Nada pode macular a imagem de um presidente que acabou com a corrupção, como ele apregoou recentemente.
A direita tem a seu favor nessa tática as redes sociais, que não eram relevantes em 2005 e convidam ao deboche. Mesmo assim, chama a atenção como a direita parece levar de um jeito muito mais leve do que o PT a reação a episódios muito parecidos, separados por 15 anos.