Quem é o empresário do setor de grafeno que agita grupos conservadores em SP

Num domingo recente, debaixo de árvores que circundam o parque do Ibirapuera, em São Paulo, militantes conservadores sentados em cadeiras de plástico discutiam como ajudar candidatos de direita a serem eleitos no pleito municipal.

Comandando o evento estava a figura carismática de Johnny Johannes, anunciando oradores, puxando preces e contando piadas, como um autêntico mestre de cerimônias naquele auditório improvisado.

Alguns o chamam de “o japonês”, mas na verdade ele é indonésio de nascença, e seu nome é o de batismo mesmo, embora pareça artístico.

A biografia de Johnny ainda tem outras peculiaridades que o destacam entre a base de apoiadores de Jair Bolsonaro em São Paulo: é maçom, bispo da Igreja Mórmon e empresário do setor de grafeno, material que o presidente considera uma espécie de ouro do futuro.

“Eu não sei por que o pessoal me chama para apresentar esses encontros. Eu sou gago, não falo português direito, e conjugação verbal não é comigo. Dizem que eu falo igual ao Bob Filho [personagem de desenho animado que tem a voz fanha]”, diz.

No evento acompanhado pela Folha, no entanto, não havia sinais de gagueira, e seu português não dava sinais de que ali falava um estrangeiro.

Johnny, que não revela a idade, chegou ao Brasil em 1968, ainda adolescente, fugindo de uma ditadura para cair em outra. Nasceu em uma família rica em Bandung, cidade nas montanhas que os colonizadores holandeses transformaram em refúgio e que depois da independência indonésia, em 1949, continuou muito frequentada pela elite local.

“Nasci num castelo. Meu avô ia ao palácio presidencial sem ser anunciado”, diz. Com o endurecimento do regime do presidente Sukarno, aliado do bloco soviético, e sua posterior derrubada por um ditador ainda mais brutal, Suharto, a situação começou a ficar instável.

“Um coronel tomou propriedades, empresa, patrimônio da minha família. Ali, sim, era ditadura. O militar não gostava de você, dava um tiro e acabou”, relembra.

A família largou tudo para trás e primeiro migrou para a Holanda. Depois de uma viagem a turismo ao Brasil, decidiu recomeçar a vida em São Paulo. Johnny formou-se em mecânica, fez curso técnico no Senai e conseguiu emprego na fábrica que a Ford tinha em São Bernardo do Campo, recentemente fechada.

“Entrei na Ford como estagiário. Com 21 anos de idade eu já supervisionava a rede de concessionárias da empresa”, diz ele, que estudou depois administração e comércio exterior.

No final dos anos 1970, vivia-se na região do ABC a efervescência do movimento sindical. “Era a época de ouro do Lula, Vicentinho, Jair Meneguelli, eles paravam aquele negócio lá”, lembra.

Talvez por isso, Johnny diz que nunca chegou a ter simpatia pela esquerda, mesmo na juventude. “Claro que todo mundo quando é estudante é condicionado a ser de esquerda. Mas no meu tempo eu gostava de OSPB [Organização Social e Política do Brasil, disciplina que falava dos valores da pátria]. A gente cantava o  Hino Nacional, Hino da Bandeira…”.

Suas convicções conservadoras, àquela altura, já estavam bastante sólidas. Em 1983, entrou para a Igreja de Jesus Cristos dos Santos dos Últimos Dias, nome oficial da religião mórmon.

Surgida nos EUA no século 19, ela tem hoje cerca de 1,4 milhão de seguidores no Brasil, a maioria em São Paulo, com templos em bairros como Jardim da Saúde, Butantã e Brooklin, além de cidades da região metropolitana.

Hoje, Johnny é bispo na igreja, com a tarefa de dar assistência espiritual aos fiéis e e ajudar em emergências. A igreja, afirma, tem gente de todos os perfis, de milionários a moradores de favelas. Sua posição o leva a frequentar a periferia de São Paulo constantemente.

“Nessa pandemia tem gente passando necessidade. Se você é bispo, você tem que ir dar assistência. Se o marido bate na mulher, tem que ir lá e ajudar. Muitas vezes é local de tráfico, mas o chefe, se vê o nosso trabalho, se vê que a gente quer ajudar, deixa entrar. Porque senão tiver autorização, você pode ser morto”, diz.

Durante as décadas seguintes, Johnny manteve-se fiel às suas convicções conservadoras, mas se sentia um outsider num país em que PT e PSDB revezavam-se no poder. Até que veio o ressurgimento da direita brasileira, em meados desta década.

“Eu nunca quis me meter em política. Mas quando vi o Brasil quase virando uma Venezuela, quis fazer alguma coisa”, diz.

Em 2018, ele foi um dos fundadores da Aliança Municipal Direita Conservadora (sem relação com o Aliança Pelo Brasil, partido que Bolsonaro pretende fundar). O grupo, que apoia o presidente de forma incondicional, deve lançar candidatos a prefeito e vereador na Grande São Paulo e interior, por partidos como PSL, PRTB, PTB e outros.

Johnny diz que o aumento do sentimento conservador é visível nas favelas que ele visita. “Antigamente as comunidades eram cinturões vermelhos. Hoje, mudou muito, você vê pessoas mais conservadoras. Os barracos são todos limpos, brilhando, parecem um pedacinho do céu. As pessoas estão indo para o lado do Bolsonaro, pintam de verde amarelo, mostram bandeiras do Brasil”, afirma.

Um dos principais problemas do país, diz, é a tentativa de grupos minoritários de imporem sua agenda sobre a população. “Tenho muitos amigos gays, que respeito. Mas a gente é mais tradição, família. Não é interessante que a minoria prevaleça sobre os direitos da maioria”, afirma.

Ele diz ter “lugar de fala” para isso. “Eu sou minoritário, venho de um país chamado Indonésia”, brinca.

O empresário Johnny Johannes, na sede da igreja mórmon em São Paulo, onde é bispo (Arquivo Pessoal)

Com filho e netos brasileiros, Johnny tornou-se empresário do setor de blindagem de carros e, há cerca de dois anos, enveredou pelo negócio do grafeno.

O material, uma espécie de folha de carbono com um átomo de espessura, pode ter usos nas indústrias eletrônica, aeroespacial e militar, entre outras. É feito a partir do grafite processado.

“É cinco vezes mais duro que o diamante, 200 vezes mais forte que o aço e cem vezes mais condutor de eletricidade do que o cobre. Algumas revistas científicas dizem que é um mercado que vale US$ 1 trilhão”, afirma.

Cientistas que pesquisam o uso do grafeno, contudo, incluindo seu descobridor, o físico russo Konstantin Novoselov, são mais cautelosos quanto a seu potencial.

No ano passado, Johnny montou a Nano Hill, com sede em Limeira (SP), onde processa grafite que vem de Bahia, Pará e Minas Gerais. Tem capacidade de produzir 50 toneladas de grafeno por ano, grande parte exportada.

“O grafeno ainda é algo pouco explorado, portanto um pouquinho caro. Mas no futuro será mais importante que o silício [usado em computadores]”, diz.

Seu próximo passo é investir em baterias de carros que usam lítio e grafeno, projeto que vem sendo pesquisado pela Universidade Mackenzie. Bolsonaro é um grande entusiasta da ideia, e voltou a falar do assunto em sua live semanal na última quinta-feira (17).

“É uma bateria que vai ter capacidade de recarregar em poucos minutos. Vai ser uma revolução na indústria automobilística mundial”, afirmou.

O Vale do Ribeira, de onde vem a família de Bolsonaro, tem algumas das maiores jazidas de grafite do país, ainda inexploradas. “O Vale do Ribeira vai ser o futuro, se souber aproveitar seu potencial”, afirma o empresário.

Mesmo com toda essa sintonia com o presidente, Johnny diz que nunca se aproximou dele. Tampouco se interessa em disputar cargos eleitorais, embora vira e mexe seja convidado. Prefere o trabalho de bastidores em prol das bandeiras conservadoras.

“Conheço alguns deputados e senadores. Eu nunca me aproximei do presidente. Claro que se um dia tiver a oportunidade de falar com ele, eu vou. Mas eu nunca quis favor”, diz.