Alvo da fúria antiglobalista, bilionário George Soros agora tem um dia para ser odiado
Qualquer galeria de figuras que a direita conservadora detesta tem de incluir George Soros. E qualquer lista de palavrões deve obrigatoriamente ter “globalismo”.
Que tal então juntar o monstro Soros ao demônio globalista? Foi o que fez o Movimento Brasil Conservador (MBC), um dos mais atuantes grupos da direita em mobilizações de rua e na internet.
O MBC criou o Dia Internacional de Combate ao George Soros, a ser celebrado em 12 de agosto, dia em que o investidor e filantropo húngaro-americano completa 90 anos.
Existem dias de combate ao racismo, ao trabalho infantil, ao cigarro e a outros males, mas um dedicado a espinafrar uma pessoa física parece ser algo inédito. Ironicamente, é um dia “internacional” contra o globalismo.
É grande a tentação de ater-se apenas ao lado bizarro dessa ideia, mas ela revela uma mensagem maior e cheia de significado. Mostra como o antiglobalismo tornou-se central para a direita, ou ao menos aquela mais radical, identificada com Donald Trump e Jair Bolsonaro.
Não basta ser crítico do feminismo, dos movimentos negros ou do ambientalismo. É preciso atacar supostas imposições que vêm de fora das fronteiras nacionais para ameaçar valores da sociedade.
É também uma tentativa da direita de responder à articulação mundial da esquerda, que vem de décadas, com suas internacionais socialistas e o Foro de São Paulo. O antiglobalismo não deixa de ser uma forma de globalismo com sinal trocado.
E por que Soros é tão demoníaco?
Provavelmente porque ele reúne as condições perfeitas para ser um conveniente saco de pancada: nasceu num país da Cortina de Ferro (embora antes da chegada do comunismo), é excêntrico, bilionário e, mais importante apoiador de causas progressistas por meio de sua Open Society.
Sua fortuna pessoal é avaliada em algo como US$ 8 bilhões, o que dá fôlego ao discurso de que só se combate o gigante globalista com a união quixotesca da direita.
O site criado especialmente para a campanha vai direto ao ponto: chama-se antiglobalismo.com, e tem versões também em espanhol, francês e italiano. Lá, é possível ter a lista completa de “crimes” de Soros, alguns mais críveis, outros meio que saídos de contos de fadas.
“Chegou a hora de lutarmos unidos contra a personificação do globalismo”, resume o MBC.
Soros, explica o movimento, é “o maior financiador da esquerda no mundo, responsável por derrubar governos e desestabilizar nações, com uma agenda que vai desde a destruição da cultura judaico-cristã, legalização do aborto, ideologia de gênero, até a censura da internet”.
Não é só. Soros, em 2013, teria sido responsável por derrubar o papa conservador Bento 16 (que todo mundo achava que tinha renunciado por livre e espontânea vontade).
Neste caso, não teria agido sozinho, mas teria tido o apoio do então presidente dos EUA, Barack Obama, e da futura candidata presidencial democrata Hillary Clinton.
(Quem se interessar em saber mais sobre essa deliciosa teoria da conspiração pode acessar esse link).
Com campanhas em diversos países, incluindo o Brasil, a Open Society apoia todo tipo de causa que é antítese da direita: direitos humanos, debates sobre descriminalização de drogas, questões reprodutivas, e por aí vai.
Em janeiro deste ano, o próprio Soros anunciou a criação de um fundo de US$ 1 bilhão para combater ditadores e criticou Bolsonaro.
A campanha contra o megainvestidor tem toda uma programação. Já está aberta uma petição online de apoio. Representantes da tropa de choque digital de Bolsonaro, como o jornalista-ativista Allan dos Santos, começaram a dar uma força ao movimento.
Nesta segunda-feira (27), começaram a ser enviados materiais por e-mail, panfletos, camisetas e faixas. Para 5 de agosto, os organizadores prometem divulgar três vídeos contra o húngaro-americano (já há um teaser no ar, que pode ser acessado pelo site).
No grande dia, 12 de agosto, o aniversário do magnata será acompanhado por manifestações, hashtags e um seminário online. E para o dia seguinte, 13, está programado um evento de entrega de assinaturas em frente ao Congresso Nacional.
A propósito: Soros, estranhamente, não se manifestou ainda.