No extremo sul de SP, bolsonarismo resiste, ao menos por enquanto

De camisa da seleção brasileira, o porteiro desempregado Rubinei dos Santos, 33, aguardava por uma cesta básica e um kit de higiene doados por uma ONG na região de Vargem Grande, extremo sul da cidade de São Paulo, na última segunda-feira (18).

Eleitor de Jair Bolsonaro em 2018, não se arrepende do voto no capitão. “Eu pelo menos vejo ele fazendo alguma coisa. Eu sou patriota, eu brigo pelo meu país”, disse.

A decepção com o presidente da República em razão da seu desempenho contra a Covid-19, além das sucessivas crises políticas, ainda não chegou a uma parcela expressiva da população.

Em camadas mais pobres, o apoio se mantém, e pode até ter crescido um pouco. Os R$ 600 do auxílio emergencial pagos pelo governo têm ajudado a segurar a aprovação do presidente.

Rubinei conseguiu sacar a primeira parcela do seu, e hoje direciona sua artilharia para o governador João Doria e o prefeito Bruno Covas, ambos do PSDB.

“Eu vejo médico, motorista, policial, tudo com autorização para trabalhar. E todo mundo tem parentes idosos. Por que só eles podem?”, pergunta.

Como mostrou o Datafolha em pesquisa realizada em 21 de abril, a avaliação positiva de Bolsonaro subiu três pontos percentuais entre os que ganham até dois salários mínimos. Entre os que recebem de dois a cinco salários, saltou seis pontos.

Mais expressiva é a curva do grupo de assalariados sem registro, em que a aprovação subiu de 31% para 44%, ou seja, 13 pontos percentuais.

No extremo sul de São Paulo, em bairros como Parelheiros, Vargem Grande e Engenheiro Marsilac, 25% das famílias são compostas por estes trabalhadores informais, segundo levantamento feito pela Associação ProBrasil, ONG que trabalha há 18 anos na região.

Demitida de uma churrascaria em razão da crise, Eliete da Costa Assunção, 47, nem por isso reclama do presidente, em quem votou.

“Eu acho que o Bolsonaro está fazendo o que pode”, diz ela, que foi mandada embora junto com quase todos os colegas. Dos 22 empregados no restaurante, sobraram apenas 2, para fazer delivery.

Ela também conseguiu o auxílio de R$ 600. “Deu uma aliviadinha numas dívidas de mercado”, afirma.

Estaríamos, então, vivendo uma espécie de lulismo de direita?

Em outras palavras: o Brasil estaria prestes a repetir o fenômeno que beneficiou o PT, em que a sustentação do governo vinha das classes mais baixas, mais do que compensando o desgastes nos segmentos médios e altos?

É muito cedo para dizer, porque há diferenças importantes entre os dois momentos. O lulismo era sustentado por um clima de bonança econômica e políticas permanentes de transferência de renda, sendo a mais conhecida o Bolsa Família.

Já o cenário atual é de profunda recessão, e a ajuda é temporária, ainda que o governo esteja já cogitando prorrogar o auxílio emergencial, que a princípio valeria por apenas três meses.

A região do extremo sul de São Paulo sempre foi um reduto petista. É um vasto território relativamente pouco povoado, com algo como 140 mil habitantes. Mescla favelas, vilas e chácaras, sob a imponente silhueta da serra do Mar. Manhãs de neblina são frequentes.

Como ocorreu com a totalidade do país, converteu-se em grande parte ao bolsonarismo em 2018.

“Sempre fui petista. Mas votei no Bolsonaro porque estava cansada”, disse a feirante Vanessa Ferreira da Cunha Lopes, 38, moradora do bairro de Colônia, uma zona quase rural a 1h30 do centro de São Paulo sem trânsito (ou o dobro num dia carregado).

Ela, no entanto, critica um presidente que “se perde nas palavras”. Variações desta avaliação se repetem nas falas de muitos dos moradores da região, inclusive dos que simpatizam com ele.

Como diz Jackson Douglas, 29, também desempregado: “O presidente é muito inteligente, só não está sabendo usar a inteligência dele”.

Ou, na avaliação de Francisco Assis da Silva, 46, dono de um bar na comunidade Jardim dos Alamos. “Em parte eu concordo com o Bolsonaro, mas ele faz algumas coisas embaçadas”.

Em outras palavras, Bolsonaro pode até ganhar algum fôlego com o auxílio emergencial e seu discurso em prol da economia, que tem ressonância entre quem não consegue renda.

Mas também nos extremos da cidade, a paciência com o descalabro de sua administração tem limites.