Briga com Moro racha dupla que comandava zap pró-Bolsonaro em 2018
O racha entre Jair Bolsonaro e Sergio Moro separou uma dupla que fez história na campanha de 2018.
O paranaense Carlos Nacli, 39, e o mineiro Newton Martins, 48, coordenaram durante aquela eleição o maior grupo de WhatsApp em defesa do então candidato Bolsonaro.
Na verdade, não era apenas um grupo, mas vários. Quase uma centena deles, reunidos numa espécie de portal que criaram, o ZapBolsonaro. Chegaram a ter quase 15 mil pessoas recebendo textos, áudios e memes que depois eram replicados em grupos menores.
Hoje, é consenso que a campanha de Bolsonaro no WhatsApp foi fundamental para sua vitória.
Mas a dupla ficou em lados opostos no grande cisma da direita provocado pela saída explosiva de Moro do governo, embora Nacli e Martins garantam que continuam amigos.
O paranaense, que mora em Portugal há dois anos, onde atua como empresário de distribuição de alimentos, está com Moro e se mostra decepcionado com o presidente que ajudou a eleger.
Já o mineiro vive em Boston (EUA), trabalhando como especialista em tecnologia de informação. Mantém-se fiel ao presidente, e torce pela sua reeleição.
A história da dupla mostra como bolsonarismo e lavajatismo são irmão siameses, e como esse divórcio traumático pode afetar profundamente a direita.
Eles se conheceram online, por volta de 2015. Nacli morava em Curitiba e fazia vigílias em frente à sede da Polícia Federal na cidade, pedindo que a Lava Jato seguisse sem trégua.
Martins, que já vivia nos EUA, fazia lives semanais para o grupo Nas Ruas, um dos mais engajados em defesa da operação e, posteriormente, no impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT).
“Não me lembro quando nos conhecemos virtualmente. Ambos participávamos de movimentos sociais que pediam a prisão de Lula e apoiavam a Lava Jato”, afirma Martins.
Eles só foram se conhecer pessoalmente no ano passado, quando o mineiro fez uma viagem para Portugal e encontrou seu antigo parceiro.
Nacli começou a se decepcionar com o presidente com alguns meses de governo. “Há tempos me incomoda a sensação de que essa bandeira [luta contra a corrupção] vem sendo deixada de lado, gerando a sensação de tratar-se de proteção de Bolsonaro aos filhos”, afirma.
Martins discorda. Diz que o presidente segue firme, apesar da oposição intensa do Judiciário, Congresso e mídia.
“Eu votei em Bolsonaro porque acredito no potencial dele. Mesmo com todas as dificuldades, ele irá transformar o Brasil para melhor. Tenho fé e muita esperança que o Brasil será um país de primeiro mundo, como os Estados Unidos, onde decidi viver”, declara.
Sobre as acusações feitas por Moro, as divergências se ampliam. “Tenho dificuldades em acreditar que ele faria acusações públicas sem ter as provas a embasá-las”, diz Nacli.
“Fiquei chocado com a saída de Moro e muito decepcionado com a forma como ele fez o anúncio. Muitas palavras ditas deveriam ter sido reservadas para um encontro entre ele e o presidente”, rebate Martins.
Mais sintomática é a diferença de resposta para uma pergunta que deve pautar a discussão na direita até a eleição de 2022: afinal, o que foi mais importante para derrotar a esquerda, a Lava Jato ou Bolsonaro?
Para Nacli, foi a operação comandada por Moro. “Com certeza o trabalho da Lava Jato abriu a janela de oportunidade para que Bolsonaro se lançasse candidato. Inclusive só teve nosso apoio com base neste compromisso”, diz.
Martins argumenta que não há dúvida sobre a quem cabe o mérito maior. “Quem derrotou o Fernando Haddad [candidato do PT] foi Jair Bolsonaro”, diz ele, que ressalva que o PT não está morto. “Muitos de seus candidatos foram eleitos para os cargos de governadores, deputados e senadores”.
Se a campanha de 2018 foi a das redes sociais, foi também a da difusão desenfreada de fake news, sobretudo por WhatsApp, como mostraram diversas reportagens, incluindo da Folha. Em alguns casos, empresários bancaram esses disparos de mensagens para prejudicar o PT.
Nesse ponto, os antigos parceiros voltam a mostrar uma frente unida, ao rejeitarem categoricamente qualquer participação em esquemas ilegais.
Nacli diz que o modelo do ZapBolsonaro era fechado, ou seja, apenas os administradores podiam enviar mensagens para os demais grupos, após checarem sua veracidade.
“Era como um portal de notícias via zap. Antes de postar, verificávamos a autenticidade da notícia e alinhávamos com nossos objetivos”, garante.
Além disso, diz ele, isso tornava mais fácil manter o objetivo central, de eleger Bolsonaro. “Em grupos abertos perde-se muito fácil o foco, e o mimimi é imenso”, afirma.
Segundo Martins, “o objetivo principal dos grupos era combater as mentiras, que são uma praga nos grupos abertos de WhatsApp”. Ele diz que o grupo era acompanhado por agências de checagem.
No divórcio amigável, Nacli ficou com cerca de 75% dos grupos e montou o ZapBrasil, hoje com aproximadamente 9.000 usuários, em que defende a chapa Janaina Paschoal-Sergio Moro para 2022.
Já Martins segue com a marca ZapBolsonaro, em site, Twitter e canal de YouTube.
Ambos já se armam para a próxima eleição, em que deverão estar em campos opostos.
“A guerra pelo zap nas eleições é incrível. Foi ela que definiu 2018. E com certeza terá forças ainda maiores em 2022”, afirma Nacli.