Quem é o guru indiano-americano da direita que diz que o coronavírus é uma farsa
Cientista, ativista, empreendedor. E, além de tudo, o menino prodígio que inventou o email.
Assim se apresenta o indiano-americano Shiva Ayyadurai, 56, uma figura um tanto folclórica que, na atual crise do coronavírus, tem desempenhado um papel de guru para parte da direita, no Brasil e no mundo.
Com o currículo de quatro diplomas do prestigiado MIT (Massachusetts Institute of Technology), Shiva tem sido mencionado por céticos da Covid-19 como uma fonte respeitável sobre a doença.
Sua tese é de que o coronavírus é uma criação da indústria farmacêutica americana, e que para prevenir-se da doença não são necessárias medidas de distanciamento social, como prega a comunidade científica internacional.
Bastaria reforçar o sistema imunológico com vitaminas, como ele disse numa entrevista recente ao site conservador americano America’s Voice.
“Temos que entender que o establishment médico e farmacêutico construiu, ao longo dos últimos cem anos, a fundamentação de sempre culpar um vírus ou um germe”, afirmou.
Segundo ele, os caçadores de vírus criam medo de maneira artificial.
“A realidade é que um sistema imunológico forte sempre lida bem com isso. A questão é como reforçar esse sistema, e a resposta é vitamina D, que é um antimicrobiano, e vitamina A”, disse.
Seu alvo principal é o médico infectologista Anthony Fauci, membro mais importante da força-tarefa criada pelo presidente Donald Trump para coordenar as estratégias de combate à Covid-19.
Para Shiva, Fauci é um representante das grandes farmacêuticas e deveria ser indiciado pela morte de milhares de pessoas nos EUA em razão da doença.
Nascido em Mumbai, principal centro econômico da Índia, Shiva chegou aos EUA aos sete anos de idade com sua família. Com uma inteligência acima da média, interessou-se cedo por ciências da computação e, mais tarde, por biociências.
Ele afirma que em 1978, quando tinha apenas 14 anos, enquanto estudante na Universidade de Medicina de Nova Jersey, escreveu um programa de computador que substituía as comunicações em papel nos escritórios.
Chamou-o de “email”, e desde então se apresenta como o criador dessa ferramenta hoje tão presente nas nossas vidas.
A comunidade científica, no entanto, não reconhece esse pleito. O consenso internacional é que o email foi criado em 1971 pelo programador americano Ray Tomlinson, morto em 2016, num sistema conhecido como Arpanet, precursor da internet.
Shiva poderia ser apenas uma figura marginal, mas ele tem sido citado no Brasil como fonte por parte da direita mais ligada ao presidente Jair Bolsonaro, que minimiza a importância do coronavírus.
Já deu entrevista, por exemplo, ao jornalista Allan dos Santos, um dos principais líderes da tropa de choque digital do presidente.
Recebeu também menções elogiosas do youtuber católico conservador Bernardo Kuster e do jornal Brasil Sem Medo, ligado ao filósofo Olavo de Carvalho.
“O alarmismo do coronavírus pelo Estado profundo entrará para a história como uma das maiores fraudes para manipular a economia, eliminar o dissenso e empurrar remédios obrigatórios”, escreveu Shiva em março, quando a crise apenas começava.
Procurei-o por meio de sua assessoria nos EUA, e pedi uma entrevista, mas não obtive resposta.
A pregação do cientista contra a grande indústria farmacêutica é muito parecida com a de grupos antivacina que proliferam pelas redes sociais.
Mas Shiva não é apenas um personagem das redes sociais. Ele também tem pretensões políticas.
Em 2018, candidatou-se como independente ao Senado de Massachusetts, mas teve apenas 3,4% dos votos. Neste ano, vai tentar de novo. Desta vez, como candidato pelo Partido Republicano, o mesmo de Trump.
Suas chances de sucesso, no entanto, são escassas, até porque Massachusetts é um estado solidamente simpatizante do Partido Democrata
De qualquer forma, seu site oficial de campanha já está no ar e a campanha, a todo vapor. Nele, dr. Shiva promete “construir a revolução para que o futuro tenha verdade, liberdade e saúde”.