‘Não sou louca, sou transgênero’; 10 lições de uma economista liberal
Antes de chegar ao Brasil, Deirdre McCloskey, 75, era conhecida por duas coisas: ser uma autêntica liberal da Escola de Chicago, discípula do papa dessa linha de pensamento, Milton Friedman; e ter mudado de gênero em 1995, quando deixou de ser Donald.
Durante sua passagem pelo país, há duas semanas, a economista ganhou notoriedade também por ter tido uma palestra cancelada pela Petrobras, provavelmente em razão da crítica ao presidente Jair Bolsonaro numa entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”.
Deirdre é uma liberal por inteiro, na economia e nos costumes, e por isso a rejeição dela a Bolsonaro. Mas ela não é xiita. Consegue enxergar situações em que limites do Estado são necessários.
Fui acompanhar sua palestra ao Partido Novo, no último dia 30. Ela é uma figuraça, debochada e com o sentimento nobre da autoironia.
Explicou que seu nome se pronuncia “deer-dre”, e aí simulou uns chifres com as mãos (“deer” é veado em inglês).
Interrompeu a palestra no meio e anunciou o motivo em alto em bom som ao microfone: “preciso fazer xixi”.
E deu uma série de lições sobre diversos assuntos. Selecionei dez:
1-) O exemplo chinês – “Em 1978, o Partido Comunista chinês decidiu parar de ser estúpido na economia. Hoje, a renda per capita na China é a mesma do Brasil. E se isso não te deprime aqui no Brasil, você é uma pessoa muito otimista”.
2-) A praga da normatização – “Cada regulação criada pelo Estado é uma mão aberta para a corrupção. Brasília diz alguma coisa a vocês sobre isso”.
3-) Conexão Pelé – “Nenhum de nós aqui é Pelé, mas as pessoas pagavam para vê-lo atuar. Nós estabelecemos uma relação de troca com ele. O liberalismo possibilita esse momento, de você ter uma conexão com o maior jogador do mundo”.
4-) Deixa povo entrar – “Restrição de movimento de pessoas é algo muito cruel. Essa ideia de que os imigrantes têm de ter sua liberdade limitada não é aceitável para liberais”.
5-) Não sou louca, sou transgênero – “A resposta da esquerda para os trânsgeneros é oferecer cirurgia de mudança de gênero gratuita. Mas a cirurgia não é cara. É o preço de um carro pequeno. A resposta certa é tirar o Estado das preferências de gênero e religiosas das pessoas.
Não sou louca, sou transgênero. Tenho quatro certificações médicas de que sou sã. Alguém aqui [na plateia] tem alguma?”.
6-) O mercado empodera – “Mercados livres sempre foram bons para mulheres. Mulheres com acesso ao mercado em países pobres têm independência de seus maridos. Ganham seu dinheiro e não o gastam em prostituição e jogatina. Gastam com seus filhos”.
7-) Resposta ao aquecimento global está errada – “Há um pânico global sobre aquecimento. Eu aceito que existe, e concordo com a ciência sobre isso. Você não pode ignorar o assunto, como faz o Trump. Mas o mundo não vai acabar rapidamente.
Instituir uma taxa sobre o carbono vai dar muito mais incentivos às pessoas para fugir da energia suja do que oferecer subsídios para construirem moinhos de vento”.
8) É permitido proibir – “Proibir o fumo em lugares fechados é uma restrição de direitos individuais. Mas eu entendo que o cigarro afeta a vida de outras pessoas. Me incomoda ver fumantes congelando no inverno de Chicago, na rua. Poderia haver uma solução intermediária.
Fumei 20 anos. Comparado a parar de fumar, trocar de gênero é fácil.
Há coisas que o governo tem de proibir. Você não pode escolher não vacinar seus filhos contra o sarampo, por exemplo.”
9-) O dilema das cotas – “Não gosto de cotas, porque desvalorizam as pessoas negras que merecem estar aonde chegaram. Mas também não vejo pessoas não-brancas neste ambiente [dirige-se à audiência]. Quando fui falar a um banco de investimentos outro dia, não havia nenhuma em 500 pessoas”.
10-) E o mais importante – “Um conselho final para meus amigos liberais: tenham senso de humor”.