Em Cuba somos perseguidos por pensar diferente, diz opositor que fugiu para o Brasil
Aos 17 anos, o metalúrgico cubano Luis Roberto Rodríguez tomou uma decisão que na maior parte do mundo seria banal, mas que acabou o transformando num perseguido político: abriu uma biblioteca.
O local na capital, Havana, recebeu o nome de Francisco Vicente Aguilera, um dos líderes da independência cubana. A ideia era que fosse um local onde livros pudessem circular livremente, mesmo que não fossem alinhados ao credo oficial marxista-leninista.
Mas o regime não tolerou a iniciativa. Rodríguez, que acumulava o trabalho na biblioteca com a militância no Partido Republicano, pequena legenda de oposição ao regime, foi preso e passou quatro anos na cadeia.
No final do ano passado, ele escapou da prisão e conseguiu sair do país com uma passagem aérea para o Suriname, um dos poucos países que cubanos podem visitar a turismo. Por terra, cruzou a fronteira para o Brasil e, por meio de contatos, foi parar em Curitiba (PR).
Lá, foi abrigado pelo grupo liberal Livres, que o está ajudando a procurar emprego (há uma campanha de arrecadação online aberta, nesse link).
“Em Cuba, somos perseguidos por pensar diferente”, afirmou Rodríguez em entrevista ao blog.
Sua prisão foi traumática, relembra, inclusive porque acabou envolvendo sua mãe, que estava com ele no momento em que a polícia da ditadura chegou na biblioteca.
O primeiro ato foi recolher os livros que ali estavam. “Quando terminaram, me colocaram ao lado da minha mãe e nos conduziram [para a prisão]. Eles me levaram arrastado pelo corredor até chegar a um calabouço, e me tiravam a qualquer hora para me interrogar”, relembra.
Nos interrogatórios, uma acusação era frequente: Rodríguez teria violado a temida Lei 88, que no papel serve para regulamentar a proteção da independência nacional e a economia de Cuba. Na prática, contudo, é ampla o suficiente para enquadrar qualquer atividade opositora como contrarrevolucionária, por mais genérica que seja a imputação.
Mal comparando, é parecida com a Lei de Segurança Nacional da ditadura militar brasileira, usada para perseguir opositores.
Sua mãe foi libertada rapidamente, mas ele não teve a mesma sorte. “Ao fim de 20 dias, me levaram para a sede da promotoria, onde me jogaram. Proibiram a entrada da minha família e dos meus amigos. Os únicos que ficaram era o promotor e a segurança do Estado, os guardas da prisão”, recorda-se.
Rodríguez acabou condenado num processo sumário. “Me levaram para uma jaula. Minha família queria despedir-se de mim e não deixaram”.
Quando protestava, era punido com um período na solitária. Certa vez, ficou 22 dias num calabouço, para onde foi arrastado “como um cachorro”. “Quando eu protestava pelos meus direitos, ia para o isolamento, num quarto escuro”.
Ele não dá detalhes de como conseguiu sair da prisão. Uma de suas preocupações é com o filho, que continua em Cuba. “Não depende de mim. Gostaria de trazê-lo para o Brasil, um país livre”, afirma.
Segundo Rodríguez, a troca de comando em Cuba, com a saída do poder dos irmãos Castro, não mudou na essência a situação no país.
Em um primeiro momento, a escolha do engenheiro Miguel Díaz-Canel como presidente do país, ocorrida em 2018, foi vista com certo otimismo pela comunidade internacional.
Ele é, afinal, representante de uma geração mais jovem do que a dos revolucionários que tomaram o poder em 1959. Nasceu um ano depois da Revolução Cubana.
Mas para o opositor, a esperança de alguma abertura democrática se mostrou falsa. “A quadrilha de Raul segue com Díaz-Canel”, diz ele.
“Até que siga no poder essa camarilha, não haverá mudança. O povo quer mudança, mas o regime não deixa”, completa.