Crises na Educação e na Cultura abalam projeto de poder da direita

Jair Bolsonaro elegeu-se prometendo a retomada do crescimento econômico, a melhora nos índices de segurança e o resgate de valores que teriam sido minados por décadas de ideologia de esquerda.

Ao fim de um ano de seu mandato, ele tem algo a mostrar em dois terços deste tripé. Com inflação controlada e juros na baixa histórica, a economia mostra alguma força para crescer em 2020.

A queda no número de homicídios, embora algo que apenas levemente possa ser creditado a seu governo, tem potencial para ser para Bolsonaro um símbolo comparável ao que foi a redução da desigualdade para o PT e a estabilidade para o PSDB.

Mas para a direita, isso não é suficiente, e por isso as crises gêmeas na Cultura e na Educação, ocorridas num intervalo de apenas dois dias, são tão danosas.

O resgate dos valores é fator importantíssimo para o conservadorismo, e para isso essas duas áreas são estratégicas. Parte da direita trocaria sem pestanejar o crescimento de 2,5% previsto para 2020 pela aprovação do Escola Sem Partido, ou pelo expurgo de Paulo Freire dos currículos escolares.

O nome disso é o combate ao “marxismo cultural”, um termo surgido nos EUA nos anos 1990 que aqui chegou uma década depois, popularizado por ele, Olavo de Carvalho.

É um dos motivos, aliás, pelos quais o professor autoexilado na Virgínia mantém-se tão influente na direita, apesar de sua verborragia escatológica.

Ideólogos de direita acreditam que, sem vencer a influência esquerdista nas escolas primárias, na academia, nos movimentos sociais e no meio cultural, não criará raízes sociais e será apenas uma marola passageira num oceano vermelho. Esse, pelo menos, é o credo de uma parte considerável da base política que sustenta Bolsonaro.

Péssima notícia para os conservadores, então, que Cultura e Educação estejam entre os setores mais caóticos de um governo que não é conhecido pela constância.

A queda de Roberto Alvim é apenas o exemplo mais absurdo de uma sucessão de erros de gestão e planejamento que transformaram o setor cultural numa balbúrdia, para tomar emprestado um termo popularizado pelo ministro Abraham Weintraub, da Educação.

O erro da divulgação das notas do Enem, admitido neste sábado (18) pelo próprio Weintraub, pode não ser tão aberrante quanto o já famoso vídeo nazistoide de Alvim, mas tem consequências mais sérias.

É mais uma demonstração de que a Educação vive desgoverno, o que é obviamente trágico para uma geração de jovens que depositam seu futuro num sistema falido.

Mas não apenas isso. Para a direita, as crises da semana que passou são uma confissão de que seu grande projeto ao chegar ao poder está incompleto.

Por terem caráter transformador, Educação e Cultura são relevantes demais para os conservadores para que fiquem sujeitos a tanta confusão.

Talvez isso acorde o governo para a necessidade de resolver os problemas de gestão das duas áreas. Se isso será preferível à bagunça, é outra história.