Direita precisa pensar no longo prazo e não ficar atrelada a Bolsonaro, diz professor

Nove meses depois de chegar ao poder com Jair Bolsonaro, a direita está em um momento de definição. Uma parte se desgarrou da figura do presidente, a ponto de hoje termos quase uma direita de oposição.

E muita gente tem se dedicado a responder a uma pergunta: como manter a direita forte politicamente no futuro, para além da euforia com a vitória eleitoral do ano passado?

Professor de filosofia e um dos coordenadores nacionais do MBL (Movimento Brasil Livre), Ricardo Almeida, 31, é uma dessas pessoas preocupadas com os próximos anos da direita.

Em um artigo recente distribuído pelo movimento, Almeida, formado em filosofia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), cita cinco pontos para um programa de direita. O texto é em parte uma avaliação crítica dos últimos anos e uma lista de metas para o futuro.

As prioridades citadas por Almeida são: ampliação do mercado editorial de autores de direita; criação de periódicos especializados para difusão de ideias; formulação de um projeto de poder de longo prazo; elaboração de pautas políticas claras; e investimento na formação de quadros de direita na administração pública.

Até aqui, diz ele, a direita tem se definido mais pela negação do que pela afirmação de suas ideias. Almeida cita três destas rejeições: do legado petista, da corrupção e da crise econômica.

Mas basear-se somente nisso é perigoso, afirma o professor, porque a força da negação do passado tende a se esvair com o tempo. É preciso algo mais.

“O que desejamos? Queremos voto distrital puro, misto ou como está? Como serão as candidaturas? Como serão as regras de formação dos partidos? Defenderemos modelos de governança baseados em quais tradições? Qual será a postura brasileira na política externa? Como será nossa diplomacia? Como será o sistema de saúde do Brasil? O transporte? Qual o projeto nacional para a educação? Tudo isso precisa ser pensado, ponto por ponto”, cobra ele no artigo.

A esta dificuldade, afirma o professor, soma-se um segundo problema, tão ou mais grave. Faltam técnicos e servidores de direita para tocar a agenda conservadora. Muitas vezes, diz ele, a turma destra se preocupa demais em aparecer nas redes sociais e menos em qualificar seu pessoal.

“Fazer barulho e aparecer é engraçadinho e coisa e tal, porém, a longo prazo, significa pouco. É preciso enfrentar a gestão pública com maturidade. Não é simples”, diz.

Conversei com Almeida sobre seu texto. Ele diz que o motivo de tê-lo escrito é que o momento de ser apenas crítico da esquerda já passou.

“De um modo geral a direita é reativa. No caso do governo Bolsonaro, essa reatividade é mais pronunciada”, afirma.

Para os próximos anos, é muito importante criar uma burocracia (no bom sentido da palavra) que seja alinhada aos princípios da direita.

“Existe uma dificuldade que o Bolsonaro e a direita estão enfrentando, que é a falta de quadros. Isso por uma razão simples, a direita é muito nova. Se faltam as pessoas, o gestor vai ser obrigado a manter gente de uma administração anterior sem alinhamento ideológico. Ou vai colocar gente ideológica sem experiência”, afirma.

O MBL, que se afastou do governo Bolsonaro nos últimos meses, está em pleno processo de discussão de suas estratégias para o futuro, o que deve culminar em um congresso nacional do movimento em novembro.

Para a eleição do ano que vem, Almeida sugere que o MBL se concentre em ocupar espaço em prefeituras de cidades menores, justamente para que haja um processo de formação de gestores.

“É mais fácil ter cargos executivos em cidades menores e construir a pirâmide de baixo para cima”, defende.

Como alerta o professor ao final de seu artigo, caso nada disso seja feito “a tendência da direita é caminhar a passos largos para a sua dissolução”.