Governo diz a ruralistas que sem reforma haverá mais 3 milhões de desempregados

Ribeirão Preto (SP) – O governo federal baixou em peso nesta semana na Agrishow, feira de máquinas agrícolas em Ribeirão Preto (SP), para cortejar os ruralistas, setor que foi fundamental na vitória de Jair Bolsonaro em outubro de 2018.

O presidente anunciou novos financiamentos, pediu juros mais baixos ao Banco do Brasil e defendeu proteção a fazendeiros que reagirem a bandidos armados. Foi aplaudido efusivamente pelo setor.

Mas o governo também cobrou apoio dos ruralistas a duas de suas principais pautas legislativas: as reformas da Previdência e tributária. Aí a coisa não foi tão fácil.

Num seminário para lideranças rurais e prefeitos na terça (30), membros da tropa de choque de Bolsonaro fizeram lobby pesado pelas reformas.

Estavam lá a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP) e o secretário de Previdência do Ministério da Economia, Leonardo Rolim. Engrossavam o coro o deputado federal Eduardo Cury (PSDB-SP), o ex-deputado tucano Luiz Carlos Hauly e o economista Bernard Appy, autor da principal proposta de reforma tributária hoje em debate no país.

O tom foi quase de súplica, e em alguns momentos parecia uma competição de quem carregava mais nos toques apocalípticos.

“Se a reforma da Previdência não passar, serão mais 3 milhões de desempregados até 2023“, disse Joice à plateia, cobrando apoio dos presentes à mudança nas aposentadorias.

Cury foi na mesma linha, de reforma ou caos. “Se fizer, o Brasil cresce de 6 a 7% ao ano. Se não fizer, esquece, manda seus filhos para fora do país”, disse.

Até o contido Rolim, um quadro técnico do ministério que brindou a audiência com um longo Power Point sobre a reforma, rendeu-se ao tom emocional ao término de sua fala. “Vocês precisam se mobilizar”, disse, dirigindo-se aos prefeitos. “Já há um movimento querendo tirar estados e municípios da reforma, isso não pode acontecer”, apelou.

O governo sabe que as reformas, sobretudo a da Previdência, são profundamente impopulares no meio rural. Além da mexida nas regras da aposentadoria no campo, há outro motivo mais sutil para que os ruralistas não façam muita questão da sua aprovação, explica o professor, Marcos Favas Neves, especialista em agronegócio da USP e FGV.

“A reforma da Previdência num primeiro momento vai valorizar o real ante o dólar. Isso é ruim para um setor que exporta muito”, afirma. No longo prazo, diz Neves, o efeito será amplamente benéfico, porque significará entrada de capital estrangeiro no agronegócio, modernização e investimentos em infraestrutura de escoamento de produção.

Mas até que ao saldo da reforma penda para o lado positivo, haverá um período que não será dos mais curtos. Ele calcula uma transição que levará de três a quatro anos.

Na parte tributária, diz Neves, o governo também não está se ajudando. “Estamos vendo alguns arroubos de aumento de tributos, como ameaça de mudanças na Lei Kandir [que isenta de alguns impostos as exportações] e redução de benefícios para compra de fertilizantes”, afirma.

Embora não diretamente relacionados à reforma tributária, esses pontos não contribuem para criar um clima de confiança com o campo, segundo o especialista. “Esse governo foi eleito para baixar imposto, não para aumentar”, diz.

A blitz do governo pelas reformas deve continuar, como disse Joice Hasselmann durante o debate. Em um apelo final ao setor rural, pediu ajuda para a batalha de convencimento da sociedade que vem pela frente.

“Estamos numa guerra de comunicação. Tem muita gente que acredita no memezinho espalhado pela CUT”, disse.

Mas nesse momento, o plenário da Agrishow já estava bem esvaziado.