O recado da direita dos EUA para Bolsonaro: Previdência é tudo

Há uma cena no filme “Vice”, sobre a vida e a carreira do ex-vice-presidente dos EUA Dick Cheney (2001-09), em que são mostrados em sequência as fachadas dos três centros de estudos que formam a nata do pensamento conservador americano: American Enterprise Institute, Heritage Foundation e Cato Institute. (Aliás, o filme é ótimo, não deixe de ver).

Quando a maré conservadora está alta, estes três baluartes ditam as tendências da direita americana. Eles têm suas diferenças: o AEI e o Heritage defendem valores conservadores clássicos e uma política externa forte; o Cato é libertário, mais preocupado com o liberalismo econômico e em reduzir a presença do Estado da vida do indivíduo.

Mas a trinca tem um ponto em comum atualmente: estão acompanhando de perto a principal notícia para a direita a surgir na América Latina em décadas. Falo, obviamente, do governo Bolsonaro.

Conversei com analistas dos três institutos nos últimos dias. Para nosso presidente, ter um selo de aprovação do conservadorismo americano é fundamental. O alinhamento ao governo Trump, afinal, é sua principal aposta na política externa. Mas engana-se quem acha que ele recebe aplausos apenas por ter derrotado o PT.

O recado que ouvi é claro: tudo depende das reformas econômicas, em especial, da Previdência. Se Bolsonaro aprovar um novo sistema de aposentadoria, será aceito no clube. Se fracassar, toda a simpatia se esvai.

Aqui, o que pensam eles:

Juan Carlos Hidalgo, analista para a América Latina do Cato Institute:

“Estou cauteloso. Vou esperar para fazer um julgamento após eu vir Bolsonaro assinando alguma lei aprovada no Congresso, especialmente se for a reforma da Previdência. Paulo Guedes me entusiasma muito. Ele vem dando todos os sinais corretos até agora sobre os principais assuntos. Há muitos Chicago Boys que não me entusiasmam, mas Guedes me entusiasma.

Bolsonaro é um populista, e populistas gostam do aplauso fácil. Por isso, esperar é a melhor aposta nesse momento. E a agenda de Guedes é extremamente liberal num país que sempre foi morno quanto ao liberalismo.

É difícil estabelecer um deadline, mas se Bolsonaro não aprovar algo da pauta econômica em três meses, quem o apoia nos EUA começará a ter dúvidas. A reforma da Previdência é o sinal que todos estão esperando. Se houver alguma medida mais forte, como um sistema de capitalização no estilo chileno, melhor ainda.

Não adianta Bolsonaro apenas abraçar a pauta econômica. Ele tem de jogar todo o seu peso político atrás dela.

O presidente tem dado os sinais certos, mas precisamos mais do que de sinais. Prefiro ser cauteloso do que ingenuamente otimista.”

James Roberts, analista do Heritage Foundation para a área de liberdade econômica e crescimento:

“Continuamos otimistas. Foi muito encorajador acompanhar os primeiros movimentos de Bolsonaro como presidente, suas opiniões sobre a saúde fiscal do Brasil. E ver como os mercados financeiros subiram desde que foi eleito.

Conservadores estão esperançosos de que ele mova a política latino-americana para longe dos extremismos e do estatismo e mais na direção do livre mercado.

Na questão econômica, o veredito ainda está por sair, mas a sinalização econômica com Guedes é importante. A reforma da Previdência é o grande teste. Bolsonaro tem  ‘momentum’ [algo como ‘impulso político’], tem condições de aprovar.

Bolsonaro não está no extremo. Extremista era o PT, Bolsonaro está trazendo a política brasileira mais para o centro. Foi por isso que muitos votaram nele, aliás.

Seus primeiros passos foram bons: na área de segurança, quanto à Venezuela, na relação com Israel, na abordagem mais realista com a China.

A chegada ao poder de Bolsonaro vai levar a um maior foco dos EUA na América Latina. É uma oportunidade que não deveria ser perdida.”

Roger Noriega, analista do American Enterprise Institute, ex-secretário de Estado para o Hemisfério Ocidental no governo George Bush filho

“O desafio de Bolsonaro será implementar políticas efetivas que demonstrem que soluções de livre mercado podem criar oportunidades econômicas, empregos e crescimento. Se ele atingir esses objetivos, merecerá crédito para dar uma virada no Brasil com sua forte liderança.

Conservadores crescem apenas se produzem resultados tangíveis com políticas bem-sucedidas baseadas no respeito à lei e à democracia e no fortalecimento da população, especialmente a mais pobre, para que melhorem de vida obtendo empregos sustentáveis e dignos na economia formal.

Estou bem impressionado com as políticas econômicas de livre mercado de Bolsonaro. Mas é preciso esperar para ver se ele conseguirá passar essas iniciativas no Congresso. Qualquer pessoa com algum conhecimento da fragmentação do Congresso brasileiro e da complexidade da política sabe que o desafio de Bolsonaro de mudar as coisas é muito duro. Mas ele tem quatro ou oito anos para implementar seu programa.

O presidente Bolsonaro só vai conseguir desmantelar as políticas socialistas se seu modelo de livre mercado produzir crescimento econômico, empregos e mobilidade social. Salário digno está no centro da justiça social e aliás, dos valores cristão.

Francamente, eu penso que parte das críticas a Bolsonaro nos EUA não é apenas pelo fato de ele dizer coisas controversas. Acho que a esquerda dos EUA não consegue aceitar o fato de que os brasileiros rejeitaram o PT e Lula.”